sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Digníssimas senhoras da Graça

Ai ai... as digníssimas senhoras da Graça. Eu as vejo e imediatamente me vem à cabeça a frase, num modo de constatação: digníssimas-senhoras-da-Graça. Sempre foi assim, desde que estou em Salvador. Passaram-se os anos e confirmei cabalmente que não existem as digníssimas senhoras da Pituba ou de Brotas, por exemplo. Isso não quer dizer que as senhoras destes bairros não sejam dignas, absolutamente.

Mas estas digníssimas senhoras da Graça... perdoe a repetição, mas não dá para não fazê-lo. Certamente eu ia perder ponto no vestibular. Não sou propriamente curiosa a respeito delas, mas sei lá, por que só as vejo aqui? Elas são para mim um emblema movente, aparecem e magnetizam minha atenção como nenhum outro tipo. Talvez porque só existam neste reduzido espaço de Salvador e por eu não ter podido, a força de sempre ter morado na Graça desde que saí de Cruz, identificar o tipo que só existe no Cabula ou na Paralela. Se bem que agora na Paralela não vivem tipos, só atores da Globo. Aliás, parece mesmo é que na Paralela todos os edifícios estão vazios. Bem, isso não é para agora.

Voltando: estas muy dignas senhoras andam de ônibus, a pé ou de motorista com a mesma inflexível compostura horizontal. Porventura pertencem a famílias ricas ou se casaram com rapaz remediado e desde os anos 70 cozinham o tempo. Para algumas destas senhoras Paripe é um balneário fora de moda há muito tempo. Para outras é muito complicado chegar lá, dizem que tem que pegar a BR.

Me parece (menos um ponto na redação) evidente que nunca trabalharam fora de casa. Porventura foram discretas ativistas políticas, de cultura um pouco superior à média soteropolitana e atentas a modismos um tanto extravagantes. Passado o tempo casaram-se, como é de praxe, e acharam lindo quando o filho entrou para o Grêmio do Vieira.

Nunca usam jeans. Normalmente usam calça ou saia sem estampa, em tom pastel, e camisa estampada com grandes figuras. Usam bijuterias douradas, às vezes dourado e preto, muita base, cabelos pintados imóveis e muito esticados para trás. O porquê de não usarem tintura em tons escuros eu não sei. As mais determinadas usam grandes óculos de sol e grandes unhas vibrantes. Essas sim sabem dar ordens a quem restou para ouvi-las.

Evidente que senhoras de outros cantos de Salvador vestem-se assim. Mas a combinação desta indumentária com um seguro ar de superioridade, com uma altivez que só se sustenta pela memória e com um semblante que traz um calmo orgulho de algo que se perdeu nas quinquilharias que guardam em casa, isso meu caro, só nas digníssimas senhoras da Graça. Pegue o ônibus Graça-Praça da Sé ou passe na Farmácia Santana e veja. Ou talvez não... faz tempo que eu não vejo uma digníssima senhora. Ademais, depois que escrevi, já não sei quem são as digníssimas senhoras da Graça.

2 comentários:

Leandro Cruz disse...

e xaizinha daqui a umas décadas?
ainda estará olhando as digníssimas senhoras da Graça - se ainda houver - com a mesma esperteza.

Leandro Cruz disse...

eu tinha visto uma matéria sobre o primeiro dia do leilão.
e li um artigo ótimo de um crítico australiano que deu o mote pro post:
http://www.guardian.co.uk/artanddesign/2008/sep/13/damienhirst.art