domingo, 5 de julho de 2009

Santo Antônio

A descrença é, hoje, impossível pra mim. Longe de ser por determinação filosófica ou fé, acho mesmo que por condicionamento e hábito. E, também, porque algumas crenças me dão prazer e me salvam.

Tinha um boteco perto do CEFET, onde fiz o ensino médio, que ficava no Santo Antônio. De vez em quando, só pra não ir de novo no bar dos Micos, a gente ia pra lá depois da aula, sempre já de noite. Era bom o caminho até lá, porque era muito misterioso. O percurso era muito escuro, e, pouco antes de chegar ao bar, a gente entrava num beco estreito do lado de uma igreja colonial enorme. Adorava o tom de mistério do caminho. Parecia que estávamos caminhando no século XVII e íamos nos bater com Gregório de Matos (li pouquíssima coisa dele, mas sempre penso nele quando me lembro daquele caminho).

Um dos pensamentos que, Deus sabe por que, sempre me vem é o fato de eu não saber qual era exatamente o caminho que a gente fazia do CEFET para o bar. Este me ocorre, sem incomodar, desde que saí do CEFET.

Então, querendo dar certa produtividade ao meu ócio, dentre outros motivos ainda não mencionáveis, resolvi a uns trinta dias que iria tentar refazer o caminho do CEFET até o bar do Santo Antonio, tentando passar pelo beco. Ia fazer o caminho de dia, porque resquícios de prudência me restam e não sou doida de andar sozinha no século XVII.

Eu desci do ônibus em frente ao CEFET e foi inevitável não pensar em mim quando cheguei naquela escola pela primeira vez (acompanhada de minha mãe). Sorri com a boca fechada, cruzei os braços, encolhi os ombros e um sentimento morno e confortável veio. Também me senti pretensiosa e cheia de certezas (!).

Fui descendo pelo Barbalho, sem me preocupar em achar logo a rua que a gente subia pro Santo Antônio. Rua de asfalto sem passeio, carro de fruta, oficina, passeio cheio de carro pra consertar. A ladeira de paralelepípedo que sobe pro Santo Antônio e o ponto onde eu pegava o Duque de Caxias para ir pra casa (só em pensar nesse ônibus me dá sono). Subi o Santo Antônio. Fui indo, fui indo, e, contra o que eu esperava, encontrei rápido a Igreja enorme, o beco, e, fiquei surpresa, o boteco ainda tava lá, com aquela varanda super-estreita. Me veio uma satisfação de dever cumprido. Pronto, fiz, podia colocar o pensamento no bolso e esperar outros.

E aproveitando que estava naquele lugar tão bom de estar, fiquei andando mais um pouco e fui parar, surpresa de novo, no Largo de Santo Antônio. Nunca tinha chegado lá por aqueles caminhos. O Largo estava lotado de gente e carro. Putz, era dia de Santo Antônio! Putz, eu resolvo ir lá no dia de Santo Antônio. Véi...

Fiquei bordejando por lá, cheiro de cerveja, vi o mar, vi o porto, coloquei a cabeça no portão do Forte de Santo Antônio. Passei em frente à igreja, entupida de gente, cativante. Sentei na escada, num lugar com sol porque estava com um leve frio, pra esperar a vontade de ir embora chegar. Fiquei só olhando e julgando quem passava, condescendente com uns e desprezando outros (tenho que parar com isso). Um tempo depois percebi uma coisa e antes de realmente ver e saber o que era, meu braço agiu e pegou. Peguei uma estatuazinha metálica de Santo Antônio, de uns três centímetros, que estava jogada no degrau da escada.

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