segunda-feira, 20 de abril de 2009

Uma Cafetina

Vou contar o que soube de um menino de verdade. Ele era magro, branco, loiro e tinha cabelo liso. Mas desfaça essa imagem porque ele era feio... não exatamente feio, mas daquele jeito que não agrada.

Ele me chamou a atenção porque o vi, ainda muito pequeno, indo para a escola sozinho. É raro um menino tão branco ir para a escola só. E também porque ele andava gesticulando descoordenadamente a cabeça, o rosto, as mãos, os braços e as pernas. E geralmente com as sobrancelhas contraídas. Algumas vezes parecia que ele estava conversando com alguém.

Eu fui levando a faculdade (e vice-versa) e ele ficando alto, sempre muito rápido. Os olhos dele olhando para todos os lugares ao mesmo tempo, não se fixavam em nada. Às vezes os meus olhos também.

Eu pensava comigo que aquele menino não devia valer nada. Mas isso no sentido figurado, não interprete mal. Ele tinha cara que aprontava todas.

De fato.

Ontem um amigo me disse que ele foi assassinado por policiais. Ele me contou a história de um documentário. Mas outrora descobri e agora reitero que pobreza não é documentário. Desgraça menos ainda.

Meu amigo me disse que ele era filho de uma prostituta que morreu de AIDS. Quando o vi pela primeira vez é possível que ele já fosse órfão. Uma cafetina ficou então tomando conta dele. E ninguém espera nada venturoso de alguém com essa história, a não ser que se trate de um provérbio ou de uma parábola.

Nessa história, que tangenciou a minha, o menino resolveu ir no máximo que a desgraça lhe estava reservada. Se a desgraça era para ele, que ele fosse dominado por ela. O caso era abraçar o diabo, ser bróder dele e, evidente, sacaniá-lo quando possível.

O guri começou a fazer estripulias mesmo. Já não me lembro a ordem das coisas que meu amigo me disse... Tinha cara de muito criança, aí começou a ajudar os meninos mais velhos a roubar, levando uma arma para dentro do lugar a ser roubado. Como, infelizmente, não é de se espantar, começou a traficar também. Mas devia ter nada de disciplina, não conseguiu pagar a droga que tinha comprado pra revender. Virou caça fácil. Nas tentativas que os traficantes maiores fizeram para matá-lo ele conseguiu fugir. Mas do policial... levou tiros. Todos tiveram escolhas. Estas, levaram a uma história assim.

Um comentário:

Ana Carla Lira disse...

É, minha cara... a história desse tal menino que esse tal amigo te contou tb me dá arrepios.
Mas pra mim é sempre bizarro constatar que só conseguimos sentir de verdade as coisas quando elas chegam perto da gente...